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Cemitério. Gente chorando, orando, contemplando, fofocando, falando com lápides, sentada em cadeiras, procurando informações, discutindo, reclamando.
Gente.
Fiz algumas das coisas acima citadas, mas também outras. Aos mortos, a putrefação, a paz eterna de uma mente sem consciência, a saudade que se esvai junto com a vida do saudoso e, não menos importante, o respeito.
Lembro-me que meu pai dizia que, nos navios, via-se obrigado - provavelmente por ser de baixa patente - a tomar banho sobre as próprias roupas sujas, para que a água doce, escassa, lavasse o corpo e também as roupas.
Ah, mas é só mais uma estória triste. O mundo está cheio delas e, penso, qual será a próxima? Ao olhar a lápide, vi a queda espiralante, como em um enxame em movimento, de pétalas de flores.
As flores caíam e dançavam, a dança da morte no dia dos mortos. Porém, em suas cores brancas e vermelhas, eu apenas via vida. Ao aproximar-me dos limites do cemitério, contemplei a mata ao redor, caatinga híbrida, e vi vida pulsante.
As flores, ah as flores, flores que dei para minha querida, que caíram para celebrar a vida, que tentaram em vão fechar minha ferida...as flores.
E, Clara, os Titãs e eu estávamos certos: "...as flores de plástico não morrem." Acho que minha escolha de materiais foi acertada e, so far, tem alcançado o objetivo almejado: não morrer.
Porque, afinal, já há morte demais no meu passado. Chega: algo deve ser duradouro.
Senti-me aspergido quando as pétalas tocaram meu corpo e os arredores do túmulo. Vida enérgica fluiu dentro de meus vasos e, contente, pensei que o próprio pretenso criador estaria jogando água sobre mim, ungindo-me e protegendo-me do Mal.
Mas, neste mundo triste, as mãos do criador eram um helicóptero dos Cavaleiros do Forró e as flores só choviam porque tudo foi muito bem pago e, ainda, com data marcada. Não creio que tenham chovido flores nos cemitérios públicos.
Porque não, se a dor é universal? Aonde está o criador e seu senso de justiça, que derrama flores sobre os pagantes e poeira sobre os não-pagantes?
Ah, mas isso tudo é obra do ser humano, dirão.
Não importa: no dia dos mortos, as flores pagas e orquestradas me fizeram sentir vivo. Mesmo sendo algo tão iníquo em origem, percebo novamente que nada neste mundo tem conotação até que a criemos.
E a minha conotação foi linda: pétalas de flores que não eram de plástico e que morrem, mas que me encheram de vida.
"Isn't it ironic, don't you think?"
Yeah, Alanis. I so do think.
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