segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Noite de Segunda - Primeiro Canto

Afirmei anteriormente que sou melancólico. Sim, o sou. Não, não sou o único.

Não temos um só nome, somos muitos. Somos uma Legião.

Tendo repetido a frase de efeito, sigo para o esmiunçar do tema. A melancolia é, em manifestação prática, estar perdido em um lugar indefinido entre o passado e o presente. A aceitação do futuro é independente desta questão. Creio que é também uma dificuldade persistente em viver-se o hoje em sua plenitude, ao menos em determinados momentos. É difícil quantificar o sentimento, tarefa ingrata.

Podemos falar de um dia em um mês, um dia de perdição. Ainda, podem ser diversos flashes diários que, durante sua duração, fazem com que essa sensação de deslocamento esteja presente. Ademais, a quantificação é meramente ilustrativa e pouco importante, já que interfere mais na vida a intensidade de tais sentimentos.

Me disseram agora que eu adotei um porco quando era criança e que ele era criado no quintal do restaurante. Tudo bem, havia um cachorro. O cachorro caçava e matava os ratos. Sim, havia ratos. O cão era vira-lata, lindo. Mesmo sem linhagem, comportava-se como um perdigueiro. Infalível. Mentira, não sei se o era. Pouco importa, está morto há tempos. A memória está dentro de minha mente e na de poucos. Quando nos formos, caso ninguém mais lembre, estará tudo morto.

Voltando a questão do porco.

Disseram-me agora há pouco que eu gostava do porco, que não queria que o matassem, quando o fizeram. Ainda assim, acho que me afeiçoei ao animal. Gosto deles, acho que eles nos lembram, por vezes, do que esquecemos de ser ao passarmos a priorzar coisas secundárias. Eu gostava do porco, mas não creio que o porco gostava de mim. Porcos gostam de alguém? Deus sabe, só ele para esclarecer questões pouco sondáveis e de irrelevante interesse para a ciência.

Ou ainda nós, em lampejos de iluminação e genialidade.

Disseram que meu pai gostava muito de mim, eu acredito. Disseram que ele fazia questão de me buscar na escola. Eu pouco lembro. Sem minha memória, pouco sou. Preciso desesperadamente saber e honrar de onde vim para que eu possa orientar o meu caminho a seguir.

Sou lágrimas, estou a chorar. Vocês devem achar interessante essa devassa da minha intimidade. Sou artista, eu gosto mesmo é de atenção.

As lágrimas que ainda não derramei devem ser vistas com um misto de perplexidade e compaixão por todos os que lêem, não? A questão é que, como diria Morrissey, do Smiths:

Everybody's got to live their lives
God knows i got to live mine

Vocês têm que viver a de vocês, então as lágrimas são distração passageira.

Fim do primeiro canto.




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